Um dos desafios das metrópoles é buscar soluções para evitar a alta propagação do Aedes aegypti. Diante disso, Campinas passa a abrigar uma biofábrica que fará a produção de mosquitos com a bactéria Wolbachia, capaz de impedir a transmissão da dengue, zika e chikungunya.
Dessa forma, a instalação tem o intuito de atender demandas de governos e comunidades que estejam enfrentando surtos das respectivas doenças. A estrutura pertence à empresa Oxitec e tem capacidade para gerar até 190 milhões de mosquitos por semana.
O foco é que esses mosquitos sejam contaminados com a Wolbachia, uma espécie de bactéria que reduz a transmissão da dengue em mais de 75%, segundo levantamento da Oxitec.
Afinal, em 2024, o Brasil viveu a maior crise de dengue registrada no país, visto que foram registrados 4.013.746 casos prováveis de dengue e 3.809 mortes, além de 232 óbitos em investigação.
Esse índice era de 1.881 casos para cada 100 mil habitantes. No atual cenário da Fiocruz, Fundação Oswaldo Cruz, a Wolbachia já é utilizada e pode ajudar no combate à dengue.
"Acho muito boa essa sinergia. Em julho foi inaugurada a Wolbito, que era a maior do mundo. Dois meses depois, já não é. Isso é muito bom para a saúde pública do Brasil", afirma Fabiano Pimenta, secretário adjunto da secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente.
Esse recorde de criação de mosquitos em laboratório era ocupado por outra fábrica brasileira, em Curitiba, no Paraná, pela Wolbito. Contudo, a nova estrutura localizada na cidade de Campinas, em São Paulo, passará a liderar este segmento.
O empreendimento, então, espera conseguir proteger até 100 milhões de pessoas anualmente com o mecanismo do uso da bactéria Wolbachia.
Diante disso, a empresa entrou com o pedido de liberação da Anvisa em março de 2025 e aguarda o aval da agência. A inauguração aconteceu no começo de outubro e está pronta para fornecer os "mosquitos contaminados".
“Com o novo complexo da Oxitec em Campinas, estamos equipados para responder imediatamente aos planos de expansão da Wolbachia do Ministério da Saúde", explicou, Natalia Verza Ferreira, diretora executiva da Oxitec Brasil.
Ainda de acordo com a diretora, o novo espaço visa garantir "que a tecnologia possa chegar rapidamente a comunidades em todo o país, de forma econômica”.
A Wolbachia é uma bactéria intracelular presente em cerca de 60% dos insetos, inclusive em alguns mosquitos. Entretanto, ela não é encontrada naturalmente no Aedes aegypti, que pode transmitir a Dengue, Chikungunya e Zika.
Segundo o Ministério da Saúde, os Aedes aegypti com Wolbachia podem ser liberados para que se reproduzam com os Aedes aegypti locais. Isso, portanto, pode estabelecer, aos poucos, uma nova população de mosquitos, todos com a bactéria.
Com o tempo, a porcentagem de mosquitos que carregam a Wolbachia aumenta, até que permaneça estável, sem a necessidade de novas liberações. Um efeito que torna o método autossustentável e uma intervenção acessível a longo prazo.
Vale destacar que os Wolbitos, como são chamados, não são transgênicos. Isso porque não há qualquer modificação genética no método e também não transmitem doenças. Afinal, esta bactéria não pode ser transmitida para humanos ou outros mamíferos.
Em 2024, a cidade de Niterói, no Rio de Janeiro, recebeu o Método Wolbachia e o resultado foi a redução de 69,4% dos casos de dengue, 56,3% de chikungunya e 37% de Zika na cidade.
Outras localidades do país também estão se valendo do método, como a capital do Rio de Janeiro, Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, Petrolina, em Pernambuco, Joinville, em Santa Catarina, Foz do Iguaçu e Londrina, ambas no Paraná.
Essa ideia surgiu em 2011, quando o pesquisador da Fiocruz, Luciano Moreira, iniciou uma série de discussões com o Ministério da Saúde do Mato Grosso do Sul para trazer uma nova alternativa para enfrentar a dengue.
Na ocasião, a equipe de pesquisadores conseguiu introduzir esta bactéria, que foi retirada da mosca-da-fruta, dentro dos ovos de Aedes aegypti. Uma descoberta realizada alguns anos antes, enquanto ele fazia seu pós-doutorado na Austrália.
Nesse sentido, foi comprovado que quando a bactéria está presente no mosquito, os vírus como o da dengue, zika e chikungunya não se desenvolvem bem, algo que pode reduzir a propagação dessas doenças.
O financiamento do Ministério da Saúde e da Fundação Bill & Melinda Gates foram essenciais para a realização das atividades em dois bairros nas cidades do Rio de Janeiro e Niterói: Tubiacanga e Jurujuba, respectivamente.
Além disso, a biofábrica de Campinas vai produzir caixinhas com ovos do mosquito com Wolbachia, que podem ser enviadas para qualquer lugar do Brasil e do mundo.
Ao adicionar água, os ovos eclodem e passam pelas fases de larva, pupa e mosquito adulto. Os insetos saem por pequenos furos no topo da caixa e iniciam o processo de disseminação da bactéria na população local de Aedes aegypti.
No atual momento, a adoção da vacina no SUS é uma alternativa importante, porém a Wolbachia chegou para somar as possibilidades de enfrentamento a este mosquito.