As gorilas-da-montanha, espécie que tem o nome científico Gorilla beringei beringei, acabam de se juntar a um grupo raro de espécies que apresentam menopausa, uma condição até pouco tempo considerada exclusiva dos seres humanos.
A descoberta foi feita por pesquisadores do Instituto Max Planck de Antropologia Evolucionista, na Alemanha, e publicada recentemente na revista científica PNAS.
O estudo foi conduzido pelos cientistas Nikolaos Smit e Martha Robbins, que analisaram décadas de observações sobre a população desses primatas no Parque Nacional Impenetrável de Bwindi, em Uganda, no centro-leste da África.
Nesse ambiente isolado, os pesquisadores acompanharam 25 fêmeas adultas de gorilas e constataram que sete delas viveram ao menos uma década após o fim do período reprodutivo.
Duas chegaram perto dos 50 anos, idade que raramente é alcançada por gorilas em ambiente natural.
De acordo com reportagem do jornal Folha de S.Paulo, para definir o chamado “tempo de vida pós-reprodutivo” os cientistas levaram em conta o intervalo médio entre os nascimentos dos filhotes, que varia de quatro a seis anos.
Quando uma fêmea passava o dobro desse tempo sem ter novas crias, e também sem registrar atividade com parceiros, ela era considerada em fase pós-reprodutiva.
A maioria dessas fêmeas tinha mais de 35 anos, limite máximo já observado para partos na natureza, e não havia tido relações por mais de sete anos e meio. Segundo as estimativas, elas passam cerca de 10% da vida adulta - iniciada aos dez anos - nesse estágio, um percentual semelhante ao da menopausa humana.
Os cientistas ainda não afirmam com certeza que o fenômeno seja idêntico ao que ocorre em mulheres, já que a ausência de novas crias poderia ser explicada por abortos espontâneos ou complicações gestacionais em idades avançadas.
Mesmo assim, análises hormonais de fêmeas mais velhas revelaram alterações semelhantes às registradas em humanos durante a menopausa, sugerindo que o fenômeno pode realmente estar presente entre as gorilas-da-montanha.
Caso os resultados se confirmem, as gorilas de Bwindi se juntarão a um grupo bastante restrito de mamíferos com essa característica.
Até hoje, o fenômeno só foi documentado em algumas espécies de cetáceos com dentes — como orcas, belugas e narvais — e em chimpanzés de uma população de Ngogo, também em Uganda.
A presença da menopausa em animais levanta uma questão fascinante: por que a evolução conservaria um traço que, à primeira vista, parece reduzir as chances de reprodução?
Sob a ótica da seleção natural, formulada por Charles Darwin no século 19, deixar de se reproduzir durante parte da vida adulta pareceria desvantajoso.
Menos descendentes significam menos oportunidades de transmitir genes adiante. No entanto, há outra forma de garantir o sucesso evolutivo: em vez de ter muitos filhotes, uma fêmea pode investir mais energia e tempo nos cuidados com poucos deles, aumentando a probabilidade de que sobrevivam e também se reproduzam.
É dessa lógica que surge a chamada “hipótese da avó”. Segundo ela, após deixar de gerar novos descendentes, uma fêmea passa a direcionar seus esforços ao cuidado com os netos - o que, indiretamente, mantém viva sua herança genética. Essa teoria ajuda a explicar a menopausa em espécies com estruturas familiares complexas, como humanos e orcas.
No caso das gorilas-da-montanha, porém, a explicação pode ser outra. Como as fêmeas frequentemente mudam de grupo ao longo da vida, muitas vezes não permanecem próximas dos próprios descendentes para cuidar dos netos — o que enfraquece a hipótese da avó.
Por isso, os pesquisadores sugerem uma alternativa: a “hipótese da mãe”. Segundo essa ideia, o período pós-reprodutivo serviria para permitir que as fêmeas terminem de criar seus filhotes mais velhos, oferecendo suporte e proteção enquanto eles amadurecem, além de contribuir para a estabilidade social dos grupos.
Ainda serão necessários mais estudos de longo prazo para confirmar essa hipótese, mas o trabalho de Smit e Robbins abre uma nova janela para compreender como a evolução moldou os ciclos de vida dos grandes símios — e, por extensão, da própria espécie humana.
Em meio às florestas densas de Uganda, as gorilas-da-montanha podem estar revelando um elo surpreendente entre nós e nossos parentes mais próximos.